domingo, 30 de abril de 2017

João Rosa de Castro - Zum


TRIBO EU

Meus dentes, minha boca inteira e o rosto.
A última gota de orvalho que rebentou naquela pétala era eu.
O Brasil aos meus pés sussurrava um barulhinho tão bom
Que eu não tinha sede,
Que eu não tinha fome,
Que eu não tinha medo.
E todos os ídolos que cantei,
E todos os livros que folheei,
E todos os pensamentos que ocultei,
Esqueci. Esqueci. Esqueci. Esqueci!
Eu autosciente nem sei onde vou parar.
Não há poesia maior que o movimento dos meus braços.

Não há ousadia maior que a suficiência dos meus passos.

domingo, 23 de abril de 2017

João Rosa de Castro - Zum


A CRUZ NA TRIBO


O que aconteceu na sua casa?
As luzes se acendiam e apagavam tarde da noite.
Teve festa? Teve briga?
O que houve?
Uns saiam, uns entravam.
Exasperados e vice-versa.
Não desconverse.
Ouviram má notícia no telejornal?
No telefone?

O que aconteceu?
A sua casa e a minha casa e as casas dos outros
Fizeram dessa rua um inferno
Que terminou com as portas fechadas.
Será que estavam ligadas ao resto do mundo estas casas?
Ou eram ilhas?
Cada janela
Com sua vista comprada para uma direção parecia um quadro cuja imagem ia mudando, ia mudando com o tempo.

E o tempo passou.

domingo, 16 de abril de 2017

João Rosa de Castro - Zum


EPOPÉIA PÓS-MODERNA


Edu levou o pai para longe.
Edu catou a própria mãe.
Edu fê-la apaixonar-se perdidamente – seduziu-a.
Edu trocou-a por uma fornecedora.
Edu fez a puta apaixonar-se também – e esqueceu-a.
Edu casou-se com uma santa mulher, a Aninha.
Edu praticou pedofilia com os filhos
Edu mexeu no orçamento da união e sumiu do mapa fugindo da polícia e se achando herói.
Fim

domingo, 9 de abril de 2017

João Rosa de Castro - Zum


ZUM


Para o alto e para frente anda ereto o velho novo homem.
Se fará nas estrelas distantes o desenho que lhe cabe
Isso veremos constantes pelos mapas das cidades.
Se parar no meio do caminho para brigar com as pedras
Ou disser que já não ama os presentes circunstantes,
Para o alto ele voa e para frente ele entoa
O seu grito, o seu hino, o seu poema mais louco.
O Evereste ever peste, ever cura que aparece.
O King-kong, king-homem que na mão carrega o mundo.

Como faz bem respirar! Como é sutil enxergar!

Para o alto, para frente, para o topo das montanhas
O seu grito longe ecoa, um tarzan-homem-aranha.
E os lares clareados com as janelas abertas.
A arquitetura pulsante ejaculando a fumaça
E a estrada longa atenta para o homem que passa.

domingo, 2 de abril de 2017

João Rosa de Castro - Zum


RITUAL DIÁRIO

Arroz para famintos.
Feijão para distraídos.
Frango na panela – quantos não gostam?
Comida simples e caviar nos estômagos.
Um bife que seja;
Picanha no churrasco de domingo.
Boys and girls absortos, e os velhos vendo comer felizes.
Garfos, facas, colheres e conchas nas mesas
Compõem a inesquecível literatura dos ouvidos.
O povo e sua marmita recheada.
O anti-povo nas filas mais sofisticadas.
Todos comendo, a beijar e a olhar;
No mesmo movimento:
Mastigar, saborear, engolir
E esperar o grande efeito alucinante.

João Rosa de Castro - Despedida - Encerramento do Blogue Lume d'Arena

Prezado leitor. É com imensa satisfação que venho expressar minha gratidão a todos que visitaram, leram, compartilharam e acompanharam o L...